23 novembro 2005

À minha família... e mais um grupo restrito de pessoas

Ultimamente – por preguiça, por não ter que pensar tanto no que escrevo ou por qualquer outra razão que neste momento me escapa – tenho escrito neste blog acerca dos mais variados temas: sentir a música, ser criança, momentos Zen, os mistérios do tempo, etc...
No entanto tenho plena consciência que tenho evitado escrever sobre um assunto que é muito importante para mim no contexto actual.
Ao longo destes anos tenho cometido, como toda a gente, muitos erros e injustiças. Penso sinceramente que a grande maioria desses erros e injustiças foram, no que diz respeito à sua natureza, erros ou injustiças por omissão muito mais do que por premeditação.

No entanto, isso não serve de desculpa. Por isso, indo directamente ao que interessa: não tenho (nem nunca tive, de resto) uma postura perante a vida e os outros que me coloque num patamar moral e comportamental que me leve a acreditar que procedi sempre da melhor forma e que, como tal, me levasse a crer que nunca me arrependeria das minhas acções e dos resultados que elas provocaram.
Neste sentido, devo dizer que tenho IMENSA pena de algumas coisas que fiz (e não fiz) e da forma como as fiz (ou, uma vez mais, de como não as fiz). Peço, por isso, desculpa - aqui neste espaço público e anónimo - a todos os que sofreram com esses actos ou omissões.
E garanto que, um dia destes, vou fazê-lo pessoalmente, com todas as palavras, tempo, compreensão e paciência que não tive quando fiz (ou não fiz) todas essas coisas de que me arrependo.
É curiosa a consciência de finitude que vamos ganhando com alguns acontecimentos que ocorrem à nossa volta.
Nos últimos tempos tenho-me lembrado de situações que, por terem ocorrido com pessoas que me eram muito próximas, me dizem sempre muito e de formas nem sempre previsíveis.
Uma dessas situações está relacionada com a lembrança que tenho da morte do meu avô. A imagem mais viva, dentro de mim, desse dia, é a imagem da minha avó a despedir-se dele. A minha avó não se despediu do meu avô como marido dela, como M. ou como pai dos filhos dela. A minha avó, enquanto transportávamos o meu avô, apenas dizia que nunca mais veria o seu amigo.
Esta foi a prova de amor mais bonita que já presenciei.
Imagino que, como todas as pessoas que vivem mais de 50 anos juntas, muitos devem ter sido os actos e omissões de que ambos se arrependeram ao longo das suas vidas.
É chegado o momento de dizer: eu também. Apesar de julgar, com toda a convicção, que as agruras e extremos do que se vive todos os dias são apenas faíscas, acredito que devemos mostrar em alguma altura, a quem nos diz muito na nossa vida, o nosso fogo interior, aquele que nunca se apaga.

Para que os meus amigos me vejam.

20 novembro 2005

Eu...

...gosto de sons saturados, baixos e intensos.
Gosto de baixos de 2 cordas, de saxofones profundos que produzem sons que arrepiam a espinha, de baterias que parecem vozes e de vozes roucas e perturbadas.
Gosto de letras atormentadas que desafiam, de forma descarada, todas as lógicas de que me lembro quando as ouço racionalmente e que são, elas próprias, um instrumento que não se exclui da composição.
Porque para mim a música não é o desempenho. Não é sequer a verificação de um conjunto exacto de normas e procedimentos. A música não é, nem pode ser na minha opinião, uma engenharia de processos sonoros.
Porque se há actividade criativa em que o todo é mais do que a soma das partes é a actividade musical.
Por isso, gosto de sons saturados, baixos e intensos.
De sons que me arrepiam e me levam, de olhos fechados, para outros lados e sensações, apesar de serem crus e toscos.

So, ladies and gentlemans, a melhor música da semana de todas as semanas dos últimos anos é mesmo a música Souvenir, dos Morphine.

Ide e multiplicai o arrepio.

01 novembro 2005

Um texto de demissão...

bem catita, por sinal:

Venho por este meio apresentar oficialmente o meu pedido de demissão da categoria dos adultos.
Resolvi que quero voltar a ter as responsabilidades e as ideias de uma criança.
Quero acreditar que o mundo é justo e que todas as pessoas são honestas e boas.
Quero acreditar que tudo é possível.
Quero que as complexidades da vida me passem despercebidas e quero ficar encantado com as pequenas maravilhas deste mundo.
Quero de volta uma vida simples e sem complicações. Estou cansado de computadores que falham, de toneladas de papel que me dão cabo da cabeça, de notícias deprimentes, de contas para pagar e da necessidade de atribuir um valor monetário a tudo o que existe.
Não quero ser obrigado a dizer adeus a pessoas queridas e, com elas, a uma parte da minha vida.
Quero ter a certeza de que Deus está no céu.
Quero viajar à volta do mundo no meu barco de papel.
Quero atirar pedras à água e ter tempo para olhar para as ondas que elas formam.
Quero acreditar que as moedas de chocolate são melhores do que as de verdade, porque podemos comê-las e ficar com a cara toda lambuzada.
Quero ficar feliz quando as flores nascerem e quando os frutos nas árvores amadurecerem.
Quero poder passar as tardes de Verão à sombra de uma árvore.
Quero que a maior competição em que eu tenha de entrar seja um jogo de futebol.
Quero voltar ao tempo em que só sabia o nome das cores, a tabuada, as cantigas de roda, o jogo da macaca, porque não fazia a menor ideia das coisas que ainda não sabia.
Quero acreditar no poder dos sorrisos, dos abraços, das palavras gentis, da justiça, da paz, dos sonhos, da imaginação, dos castelos no ar.
Quero convercer-me que tudo isto vale muito mais do tudo o resto.

Já acordei :-(