23 novembro 2005

À minha família... e mais um grupo restrito de pessoas

Ultimamente – por preguiça, por não ter que pensar tanto no que escrevo ou por qualquer outra razão que neste momento me escapa – tenho escrito neste blog acerca dos mais variados temas: sentir a música, ser criança, momentos Zen, os mistérios do tempo, etc...
No entanto tenho plena consciência que tenho evitado escrever sobre um assunto que é muito importante para mim no contexto actual.
Ao longo destes anos tenho cometido, como toda a gente, muitos erros e injustiças. Penso sinceramente que a grande maioria desses erros e injustiças foram, no que diz respeito à sua natureza, erros ou injustiças por omissão muito mais do que por premeditação.

No entanto, isso não serve de desculpa. Por isso, indo directamente ao que interessa: não tenho (nem nunca tive, de resto) uma postura perante a vida e os outros que me coloque num patamar moral e comportamental que me leve a acreditar que procedi sempre da melhor forma e que, como tal, me levasse a crer que nunca me arrependeria das minhas acções e dos resultados que elas provocaram.
Neste sentido, devo dizer que tenho IMENSA pena de algumas coisas que fiz (e não fiz) e da forma como as fiz (ou, uma vez mais, de como não as fiz). Peço, por isso, desculpa - aqui neste espaço público e anónimo - a todos os que sofreram com esses actos ou omissões.
E garanto que, um dia destes, vou fazê-lo pessoalmente, com todas as palavras, tempo, compreensão e paciência que não tive quando fiz (ou não fiz) todas essas coisas de que me arrependo.
É curiosa a consciência de finitude que vamos ganhando com alguns acontecimentos que ocorrem à nossa volta.
Nos últimos tempos tenho-me lembrado de situações que, por terem ocorrido com pessoas que me eram muito próximas, me dizem sempre muito e de formas nem sempre previsíveis.
Uma dessas situações está relacionada com a lembrança que tenho da morte do meu avô. A imagem mais viva, dentro de mim, desse dia, é a imagem da minha avó a despedir-se dele. A minha avó não se despediu do meu avô como marido dela, como M. ou como pai dos filhos dela. A minha avó, enquanto transportávamos o meu avô, apenas dizia que nunca mais veria o seu amigo.
Esta foi a prova de amor mais bonita que já presenciei.
Imagino que, como todas as pessoas que vivem mais de 50 anos juntas, muitos devem ter sido os actos e omissões de que ambos se arrependeram ao longo das suas vidas.
É chegado o momento de dizer: eu também. Apesar de julgar, com toda a convicção, que as agruras e extremos do que se vive todos os dias são apenas faíscas, acredito que devemos mostrar em alguma altura, a quem nos diz muito na nossa vida, o nosso fogo interior, aquele que nunca se apaga.

Para que os meus amigos me vejam.

20 novembro 2005

Eu...

...gosto de sons saturados, baixos e intensos.
Gosto de baixos de 2 cordas, de saxofones profundos que produzem sons que arrepiam a espinha, de baterias que parecem vozes e de vozes roucas e perturbadas.
Gosto de letras atormentadas que desafiam, de forma descarada, todas as lógicas de que me lembro quando as ouço racionalmente e que são, elas próprias, um instrumento que não se exclui da composição.
Porque para mim a música não é o desempenho. Não é sequer a verificação de um conjunto exacto de normas e procedimentos. A música não é, nem pode ser na minha opinião, uma engenharia de processos sonoros.
Porque se há actividade criativa em que o todo é mais do que a soma das partes é a actividade musical.
Por isso, gosto de sons saturados, baixos e intensos.
De sons que me arrepiam e me levam, de olhos fechados, para outros lados e sensações, apesar de serem crus e toscos.

So, ladies and gentlemans, a melhor música da semana de todas as semanas dos últimos anos é mesmo a música Souvenir, dos Morphine.

Ide e multiplicai o arrepio.

01 novembro 2005

Um texto de demissão...

bem catita, por sinal:

Venho por este meio apresentar oficialmente o meu pedido de demissão da categoria dos adultos.
Resolvi que quero voltar a ter as responsabilidades e as ideias de uma criança.
Quero acreditar que o mundo é justo e que todas as pessoas são honestas e boas.
Quero acreditar que tudo é possível.
Quero que as complexidades da vida me passem despercebidas e quero ficar encantado com as pequenas maravilhas deste mundo.
Quero de volta uma vida simples e sem complicações. Estou cansado de computadores que falham, de toneladas de papel que me dão cabo da cabeça, de notícias deprimentes, de contas para pagar e da necessidade de atribuir um valor monetário a tudo o que existe.
Não quero ser obrigado a dizer adeus a pessoas queridas e, com elas, a uma parte da minha vida.
Quero ter a certeza de que Deus está no céu.
Quero viajar à volta do mundo no meu barco de papel.
Quero atirar pedras à água e ter tempo para olhar para as ondas que elas formam.
Quero acreditar que as moedas de chocolate são melhores do que as de verdade, porque podemos comê-las e ficar com a cara toda lambuzada.
Quero ficar feliz quando as flores nascerem e quando os frutos nas árvores amadurecerem.
Quero poder passar as tardes de Verão à sombra de uma árvore.
Quero que a maior competição em que eu tenha de entrar seja um jogo de futebol.
Quero voltar ao tempo em que só sabia o nome das cores, a tabuada, as cantigas de roda, o jogo da macaca, porque não fazia a menor ideia das coisas que ainda não sabia.
Quero acreditar no poder dos sorrisos, dos abraços, das palavras gentis, da justiça, da paz, dos sonhos, da imaginação, dos castelos no ar.
Quero convercer-me que tudo isto vale muito mais do tudo o resto.

Já acordei :-(

19 outubro 2005

.ponto (quase final)

"Pasmo sempre quando acabo qualquer coisa. Pasmo e desolo-me. O meu instinto de perfeição deveria inibir-me de acabar; deveria inibir-me até de dar começo. Mas distraio-me e faço. O que consigo é um produto, em mim, não de uma aplicação de vontade, mas de uma cedência dela. Começo porque não tenho força para pensar; acabo porque não tenho alma para suspender."

Fernando Pessoa, sobre O Livro do Desassossego

26 setembro 2005

Momento Zen

Hoje de manhã tive uma revelação, um momento Zen... passo a explicar:
Estava a ver uma reposição do "Late Night Show" com o Conan O'Brien e o convidado era o actor Sir Anthony Hopkins.
No entanto, e ao contrário do que é habitual, o programa não foi histérico ou especialmente divertido. O anfitrião conduziu uma entrevista normal a um Anthony Hopkins sereníssimo, tranquilo, um "actor Zen" como lhe chamou Conan O'Brien.
A dada altura, do alto dos seus 68 anos, Anthony Hopkins disse qualquer coisa parecida com isto:
"Às vezes convidam-me para ir dar umas aulas à UCLA e o que me incomoda mais é a tensão, o nervosismo, a urgência daqueles alunos. E eu, porque também já fui jovem e também já fui assim, costumo dizer-lhes que o mundo amanhã vai voltar a girar e que a harmonia na vida deles não depende de um 17 ou de um 18, de um encontro satisfatório, da concretização de todos os seus sonhos. Não quer dizer que não lutem por tudo isso - devem fazê-lo - mas aceitem e aprendam com os sucessos e também com os insucessos e frustações."

Elementar... parece um daqueles conselhos dos livros de auto-ajuda que se vendem nas estações de serviço.
Mas é - e foi para mim - muito mais do que isso. Porque as palavras foram acompanhadas, e confirmadas, pela postura. Pela aceitação. Pela quietude. Pelo sossego.
Parece contraditório, mas não é. É precisamente assim que deve ser:

Sossega, coração! Não desesperes!

"Sossega, coração! Não desesperes!

Talvez um dia, para além dos dias,
Encontres o que queres porque o queres.
Então, livre de falsas nostalgias,
Atingirás a perfeição de seres.

Mas pobre sonho o que só quer não tê-lo!
Pobre esperença a de existir somente!
Como quem passa a mão pelo cabelo
E em si mesmo se sente diferente,
Como faz mal ao sonho o concebê-lo!

Sossega, coração, contudo! Dorme!

O sossego não quer razão nem causa.
Quer só a noite plácida e enorme,
A grande, universal, solente pausa
Antes que tudo em tudo se transforme."

Fernando Pessoa, 2-8-1933.

PS - Força para todos os que andam inquietos com as teses. Sosseguem, contudo.

20 setembro 2005

O tempo, o contexto e o eterno retorno

Em boa verdade não me recordo exactamente onde, nem quando, mas lembro-me de ter lido um texto em que se defendia que o soneto "Alma minha gentil" de Camões e a letra da música "There's a light and it never goes out" dos Smiths podiam ter sido escritos pela mesma "alma".
Importa esclarecer que sempre fui bastante céptico no que diz respeito a estas comparações.
Como bom Português que sou, a simples hipótese de comparação entre um poeta maior da nossa Língua e um cantor (o Morrisey é muito bom cantor, sem dúvida, mas ainda assim um cantor) pareceu-me totalmente descabida.
Hoje, também não sei bem porquê, decidi procurar a letra da dita canção no Google.
Concedo. À excepção dos elementos contextuais óbvios e visíveis (não existiam carros, nem autocarros de 2 andares ou camiões de 10 toneladas no século XVI) e ainda dos aspectos formais que distinguem um soneto de uma letra de música, qualquer um dos textos fala dos mesmos temas: amor, saudade, distância e desprendimento.
E por sinal, qualquer um deles é bastante bem escrito.

"Alma minha gentil, que te partiste
tão cedo desta vida descontente,
repousa lá no Céu eternamente,
e viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
memória desta vida se consente,
não te esqueças daquele amor ardente
que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
alguma cousa a dor que me ficou
da mágoa, sem remédio, de perder-te,

roga a Deus, que teus anos encurtou,
que tão cedo de cá me leve a ver-te,
quão cedo de meus olhos te levou."

Luís de Camões

"Take me out tonight
Where there's music and there's people
And they're young and alive
Driving in your car
I never never want to go home
Because I haven't got one
Anymore

Take me out tonight
Because I want to see people and I
Want to see life
Driving in your car
Oh, please don't drop me home
Because it's not my home,
it's their Home,
and I'm welcome no more

And if a double-decker bus
Crashes into us
To die by your side
Is such a heavenly way to die
And if a ten-ton truck
Kills the both of us
To die by your side
Well, the pleasure - the privilege is mine

Take me out tonight
Take me anywhere,
I don't care I don't care, I don't care
And in the darkened underpass
I thought Oh God, my chance has come at last
(But then a strange fear gripped me and I
Just couldn't ask)

Take me out tonight
Oh, take me anywhere,
I don't care I don't care, I don't care
Driving in your car
I never never want to go home
Because I haven't got one,
Oh, I haven't got one

And if a double-decker bus
Crashes into us
To die by your side
Is such a heavenly way to die
And if a ten-ton truck
Kills the both of us
To die by your side
Well, the pleasure - the privilege is mine

There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out
There Is A Light And It Never Goes Out"

The Smiths

14 setembro 2005

sportstyle e lifestyle

Nos treinos de Judo, e nos de outras artes marciais, são-nos ensinados os princípios morais do guerreiro. Este código de honra tácito tem o nome de Bushido.
Bushido, literalmente traduzido, significa "Caminho do Guerreiro". Em Japonês, o vocábulo "Bushi" significa guerreiro e o vocábulo "Do" caminho. O ideograma para caminho, em japonês, é equivalente à forma chinesa “Tao” e exprime o conceito filosófico de absoluto.
A este conceito está subjacente, deste modo, a origem, o princípio e a essência de todas as coisas.
Seguir o Bushido é dar ênfase à lealdade, fidelidade, auto-sacrifício, justiça, espírito marcial e honra.
Neste sentido, todos somos "Bushi", i.e., todos somos guerreiros.
Na cultura Japonesa, um guerreiro é um indivíduo que procura o seu caminho, que tem objectivos e que, através deles, passa a ter consciência dos seus dons e das suas limitações.
Através dessa consciência o guerreiro tenta atingir os seus objectivos, combinando a sua perseverança com a vontade de vencer as suas fraquezas, os seus temores e as suas limitações.
Tenho saudades do tempo em que tinha tempo para ir ao Judo.
O Judo não é apenas um sportstyle.
O Judo é sobretudo um lifestyle que me inspira e me ajuda a trazer a cabeça alta.

05 setembro 2005

Medicação para a angústia

Posologia:
Usufruir com raiva moderada, várias vezes ao dia.
Nunca usar em vão ou em circunstâncias vãs.
Ler e sentir todas as palavras facilita a actuação do seu princípio activo.

Efeitos secundários:
Irritação ligeira mas permanente de querer, mas não conseguir, escrever assim.

LIBERDADE

Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.

Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...

Fernando Pessoa

26 agosto 2005

Urgência e languidez

Vivemos num tempo fugidio. Cheios de esperanças e medos recalcados.
Vivemos num sopro. Cheios de pressa e urgência.
Vivemos demais. Mas vivemos de menos.

Escreve-se demais.
Vê-se demais.
Fotografa-se demais.
Pergunta-se demais.
Racionaliza-se demais.

Nunca houve tantos comentadores, especialistas e contactos.
Nunca houve tantas ferramentas de comunicação que nos obrigam a escrever, a ler, a estar sempre contactável.

Se for possível quero paz e silêncio.
Quero não fazer parte deste tempo de urgência do registo.

Se for possível quero perder-me.
Andar longe ou perto ou nem sequer saber que passei por lá.

Não quero a urgência do registo.
Quero de volta a languidez de existir.

24 agosto 2005

O pensamento...

... mais fantástico que ouvi nos últimos meses:

"Todas as vidas têm destroços. O que é importante é não perder a capacidade de encaixar as peças de uma maneira diferente."

Brilhante.
OK, admito. A verdade é que estou completamente viciado na série "A educação de Max Bickford".
E nem que fosse apenas por poder ler este pensamento e saborear todos os reflexos do seu sentido, tinha valido a pena não perder um único episódio.

03 agosto 2005

Anteontem...

...aconteceu um daqueles momentos raros de harmonia em que tudo parece fazer sentido.
Era de noite. Num café cheio de gente. Eu no meio da gente. No meio do tédio rotineiro do descafeinado e dos jornais desportivos.
Um programa novo e desconhecido a passar na televisão. Tanto barulho que não se ouve o som.
Voz... li o nome. Da poesia de expressão Portuguesa. Serviço Público.
Não vou conseguir ouvir uma única palavra das muitas que, calculo, vão ser ditas.
Não há harmonia possível.

Legendas!

Afinal é mesmo serviço público!

Por entre imagens do Bairro Alto, de profissões e pessoas que conservam, orgulhosas, a sua designação e memória, desfilam as palavras. As imagens e palavras do lugar, das profissões, dos utensílios, das pessoas. De barbeiros, tesouras e barbearias. De vendedoras de fruta no meio da rua, de balanças com pesos de ferro oxidados e sacos de plástico verdes.
As palavras que são memórias de pessoas melancólicas por terem que recordar. As imagens que são lugares esbatidos por exisitirem sobretudo nas memórias do que lá se viveu.

O poema, as palavras que li estão transcritas em baixo.
O momento de harmonia fica só para mim.

Lisbon Revisited (1926)

"Nada me prende a nada.
Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo.
Anseio com uma angústia de fome de carne
O que não sei que seja -
Definidamente pelo indefinido...
Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto
De quem dorme irrequieto, metade a sonhar.

Fecharam-me todas as portas abstratas e necessárias.
Correram cortinas de todas as hipóteses que eu poderia ver da rua.
Não há na travessa achada o número da porta que me deram.

Acordei para a mesma vida para que tinha adormecido.
Até os meus exércitos sonhados sofreram derrota.
Até os meus sonhos se sentiram falsos ao serem sonhados.
Até a vida só desejada me farta - até essa vida...

Compreendo a intervalos desconexos;
Escrevo por lapsos de cansaço;
E um tédio que é até do tédio arroja-me à praia.
Não sei que destino ou futuro compete à minha angústia sem leme;
Não sei que ilhas do sul impossível aguardam-me náufrago;
ou que palmares de literatura me darão ao menos um verso.

Não, não sei isto, nem outra coisa, nem coisa nenhuma...
E, no fundo do meu espírito, onde sonho o que sonhei,
Nos campos últimos da alma, onde memoro sem causa
(E o passado é uma névoa natural de lágrimas falsas),
Nas estradas e atalhos das florestas longínquas
Onde supus o meu ser,
Fogem desmantelados, últimos restos
Da ilusão final,
Os meus exércitos sonhados, derrotados sem ter sido,
As minhas cortes por existir, esfaceladas em Deus.

Outra vez te revejo,
Cidade da minha infância pavorosamente perdida...
Cidade triste e alegre, outra vez sonho aqui...

Eu? Mas sou eu o mesmo que aqui vivi, e aqui voltei,
E aqui tornei a voltar, e a voltar.
E aqui de novo tornei a voltar?
Ou somos todos os Eu que estive aqui ou estiveram,
Uma série de contas-entes ligados por um fio-memória,
Uma série de sonhos de mim de alguém de fora de mim?

Outra vez te revejo,
Com o coração mais longínquo, a alma menos minha.

Outra vez te revejo - Lisboa e Tejo e tudo -,
Transeunte inútil de ti e de mim,
Estrangeiro aqui como em toda a parte,
Casual na vida como na alma,
Fantasma a errar em salas de recordações,
Ao ruído dos ratos e das tábuas que rangem
No castelo maldito de ter que viver...

Outra vez te revejo,
Sombra que passa através das sombras, e brilha
Um momento a uma luz fúnebre desconhecida,
E entra na noite como um rastro de barco se perde
Na água que deixa de se ouvir...

Outra vez te revejo,
Mas, ai, a mim não me revejo!
Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,
E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim -
Um bocado de ti e de mim!..."


Álvaro de Campos

28 julho 2005

the final countdown

Fitter Happier - Radiohead

"This is the Panic Office, section nine-seventeen may have been hit. Activate the following procedure:

Fitter, happier, more productive,
comfortable,
not drinking too much,
regular exercise at the gym (3 days a week),
getting on better with your associate employee contemporaries,
at ease,
eating well (no more microwave dinners and saturated fats),
a patient better driver, a safer car (baby smiling in back seat),
sleeping well (no bad dreams), no paranoia,
careful to all animals (never washing spiders down the plughole),
keep in contact with old friends (enjoy a drink now and then),
will frequently check credit at (moral) bank (hole in the wall),
favors for favors,
fond but not in love,
(...)
no killing moths or putting boiling water on the ants,
car wash (on Sundays),
no longer afraid of the dark or midday shadows
nothing so ridiculously teenage and desperate,
nothing so childish,
at a better pace, slower and more calculated,
no chance of escape,
concerned (but powerless),
an empowered and informed member of society (pragmatism not idealism),
will not cry in public,
less chance of illness,
(...)
a good memory,
still cries at a good film,
still kisses with saliva,
no longer empty and frantic like a cat tied to a stick,
that's driven into frozen winter shit (the ability to laugh at weakness),
calm,
fitter,
healthier
and more productive

a

pig

in

a

cage

on

antibiotics."

Férias.
Só preciso de férias.
Longe daqui, do computador, dos backups e dos e-mails.
Apenas com livros, sol e silêncio.
Depois sim.

"Calm, fitter, happier, healthier and more productive."

Obrigado.

25 julho 2005

Fake Plastic ______ (fill in the blank)

Os recados. As notícias. As reflexões.
Os posicionamentos feitos de avanços e recuos que, de tão previsíveis, se tornam tão tristes...
A falta de arrojo. Os jogos de xadrez em tabuleiros de polietileno. Ainda por cima é tudo plástico e inox hiper-areado. Sem brilho, sem novidade, sem preservar qualquer sabor. E que, de tão gasto, nos leva a crer que o plástico sabe bem.
Os Radiohead já tinham falado disto. A única diferença é que, pelos vistos, a gravidade (no sentido da qualidade do que é grave) nem sempre ganha.

Fake Plastic Trees

A green plastic watering can

For a fake chinese rubber plant
In the fake plastic earth

That she bought from a rubber man
In a town full of rubber plans
To get rid of itself

It wears her out, it wears her out
It wears her out, it wears her out

She lives with a broken man
A cracked polystyrene man
Who just crumbles and burns

He used to do surgery
On girls in the eighties
But gravity always wins

And it wears him out, it wears him out
It wears him out, it wears him out

She looks like the real thing
She tastes like the real thing
My fake plastic love

But I can't help the feeling
I could blow through the ceiling
If I just turn and run

And it wears me out, it wears me out
It wears me out, it wears me out

And if I could be who you wanted
If I could be who you wanted
All the time, all the time.

:-(

12 julho 2005

Descanso emocional

Estou Cansado

Estou cansado, é claro,

Porque, a certa altura, a gente tem que estar cansado.
De que estou cansado, não sei:
De nada me serviria sabê-lo,
Pois o cansaço fica na mesma.
A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu.
Sim, estou cansado,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto —
Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma,
E por cima de tudo uma transparência lúcida
Do entendimento retrospectivo...

Álvaro de Campos

07 julho 2005

Um dia e um caminho, dois dias e um caminho...

Um dia destes hei-de ganhar coragem.
Para te dizer que contigo apetece.
Sempre.
Estar.
Viver.
Decorar uma árvore de Natal.
Ir e vir.
Não ir e não saber nada acerca da vinda.
Não saber o porquê.


"A vida de cada homem é um caminho em direcção a si mesmo, a tentativa de um caminho, o esboço de uma vereda. Nenhum homem chegou a ser ele mesmo totalmente; no entanto, cada um aspira chegar, uns às cegas, outros com mais luz, cada um como pode. Todos levam consigo, até ao fim, os restos do seu nascimento, viscosidades e cascas de um mundo primário. (...) Todos temos em comum as nossas origens, as nossas mães; todos procedemos do mesmo abismo mas cada um tende à sua própria meta, como uma tentativa e uma projecção desde as profundidades. Podemos entender-nos uns aos outros, mas interpretar é algo que só cada um pode fazer consigo mesmo."
Herman Hesse, Demian

03 julho 2005

As palavras mais importantes

Todas as palavras que escrevi e todos os segundos que demorei a escrevê-las valem quase nada.
Um compasso de 3 segundos. Um estalar de dedos. Uma vida.
Tanto tempo a escrever. Tanto tempo a respirar. Tão pouca urgência em valorizar o que realmente importa.
Aqui estão as palavras, os intervalos, os silêncios, o que realmente importa.
E que tal participar, com urgência, com as palavras mais importantes? As palavras que realmente nos definem?

As palavras que compõem o nosso nome.
As minhas palavras já constam da lista.
Ide e multiplicai a mensagem.

28 junho 2005

O algoritmo da memória...

Seleccionar a música.
Pressionar o play.
Começar a ouvir.
Fechar os olhos.
Viajar no tempo.
Ouvir 2:44' de música que são 3 ou 4 anos inteiros.
Lembrar algumas coisas desses anos: os testes de Francês e de Ciências Naturais, o bate-pé, o estômago e o coração aos saltos porque se vislumbrou um sorriso.
Abrir os olhos.
Procurar a letra no Google.
Considerar, com sarcasmo, que a letra é ingénua e inconsequente.
Pensar: "Tal como eu, para aí dos 13 aos 16 anos."
Copiar a letra.
Colar neste post.

Catch - The Cure

Yes I know who you remind me of
A girl I think I used to know
Yes I’d see her when the day got colder
On those days when it felt like snow
You know I even think that she stared like you
She used to just stand there and stare
And roll her eyes right up to heaven
And make like I just wasn’t there

And she used to fall down a lot
That girl was always falling
Again and again
And I used to sometimes try to catch her
But I never even caught her name

And sometimes we would spend the night
Just rolling about on a floor
And I remember
Even though it felt soft at the time
I always used to wake up sore
You know I even think that she smiled like you
She used to just stand there and smile
And her eyes would go all sort of far away
And stay like that for quite a while

I sometimes even tried to catch her
But I never even caught her name

Dar a possibilidade de ouvir um excerto ali.
Voltar ao presente.
Seleccionar Publish Post.

26 junho 2005

Boa noite!

Os meus sonhos eram, há uns tempos já idos, preenchidos por mil e um outros sonhos e pessoas.
Sonhava ter uma voz que fosse uma mistura divina das vozes do Chris Cornell e do Eddie Vedder.
Sonhava tocar guitarra como o Jimi Hendrix, escrever como o Fernando Pessoa, jogar futebol como o Guardiola...

Os meus sonhos são, no tempo presente, bem mais simples.
Apenas sonho com a capacidade de ter dignidade. De acreditar. De não adiar. De conseguir sem pisar ninguém. De ser egoísta sem ser egocêntrico. De partilhar. De conseguir retribuir o amor que me dão incondicionalmente.

Os meus sonhos são, hoje em dia, o que quero ser e albergam as pessoas que realmente me importam.
Antes eram apenas sonhos acerca do que eu julgava que os outros quereriam que eu fosse.
E por isso são, agora sim e com toda a propriedade, os MEUS sonhos.
E não apenas sonhos moldados por mil e um outros sonhos e pessoas que nunca poderão tomar forma em mim.

20 junho 2005

Portugal, a agricultura e o meu pai

Não, não vou falar da Política Agrícola Comum. Não que não seja importante mas há assuntos, actualmente, bem mais importantes.
Recentemente assistiu-se em Portugal a uma manifestação de partidos nacionalistas que vieram para a rua agitar bandeiras de Portugal e dizer que têm orgulho em ser brancos e que a culpa disto estar como está é dos imigrantes.

O meu pai, depois de se reformar, tem-se dedicado à agricultura.
Uma das imagens mais fortes que guardo desta nova actividade a que ele se dedica é a da colocação do pau de medrar. O pau de medrar é um auxílio às plantas e árvores em crescimento ou desenraízadas para que elas se possam desenvolver correctamente, sem serem prejudicadas pelo vento, por outras plantas mais fortes ou pela tendência inata para crescerem tortas se não tiverem apoio.

Na minha opinião o Estado devia ser o pau de medrar de todos os (imensos) desenraízados existentes em Portugal. Devia, deste modo, garantir um direito integral e sem reservas a uma cidadania integral, sem exclusões.
Na minha opinião, a criminalidade organizada destes grupos de desenraízados existe porque, à semelhança do que acontece com a criminalidade praticada por indivíduos de outras etnias, eles não têm hipóteses de trabalhar, de descontar, de ter apoio na doença, de ter padrões de vida minimamente aceitáveis como a grande maioria dos cidadãos.
Se o Estado fosse um penhor destes apoios, destes paus de medrar, do ataque às causas sociais e culturais na génese destes actos, poderia haver uma política séria de punição dos transgressores. Com a força da lei e da autoridade moral de quem pode punir porque garante condições para que estes actos não ocorram, de quem garante a possibilidade de exercício de uma cidadania plena, com direitos e deveres.

Nós, os Portugueses, somos culturalmente a miscigenação, o equilíbrio, a síntese, a tolerância e não a imposição, a ruptura, a intolerância.
O meu pai, que é a pessoa maior do pequeno mundo que é o meu, já teve um filho (três, para que conste) e já plantou imensas árvores. Que eu saiba, para se encaixar naquele cliché ancestral do Ser Português, só ainda não escreveu um livro.
Mas, em compensação, já ajudou muitas pessoas, plantas e árvores a medrar. Com carinho, liberdade e tolerância mas sem negligenciar os deveres e responsabilidades.
E nunca utilizou os paus para punir. Apenas para ajudar a crescer.

14 junho 2005

the present tense

Present Tense - Pearl Jam

"do you see the way that trees bend?
does it inspire?
leaning out to catch the sun's rays,
a lesson to be applied

are you getting something out of this all-encompassing trip?
you can spend your time alone, redigesting past regrets,
or you can come to terms and realize
you're the only one who can't forgive yourself,
makes much more sense to live in the present tense.

have you ideas on how this life ends?
checked your hands and studied the lines?
have you the belief that the road ahead ascends off into the light?
seems that needlessly it's getting harder
to find an approach and a way to live.

are we getting something out of this all-encompassing trip?
you can spend your time alone redigesting past regrets,
or you can come to terms and realize
you're the only one who cannot forgive yourself,
makes much more sense to live in the present tense."

Será o presente um tempo verbal? Um estado de espírito - tenso e permanente? Um escrito em constante progressão?
A indefinição do poema mais belo e claro é como a espuma das ondas.
Não é o mar mas cheira a mar.
A poesia não é a vida. Mas cheira a vida. Com ou sem acento no 'a'?

13 junho 2005

Sobre a flexibilidade...

Ouvi um dia num filme qualquer (julgo que foi no filme Braveheart) que os homens inflexíveis são mais facilmente admirados. Pela pose, pela impenetrabilidade, pelo seguimento cego e determinado das suas ideias, pelas suas convicções, pelo olhar penetrante.
Em termos cognitivos, no entanto, foi provado em diversos estudos que uma característica fundamental da capacidade de aprendizagem é, precisamente, a flexibilidade: representacional, casuística, conceptual - isto é, a flexibilidade cognitiva. Valorizam-se, deste modo, múltiplas representações do conhecimento que contribuem para a construção de estruturas cognitivas mais fortes (em profundidade e horizontalidade - conhecimento conceptual e conhecimento declarativo) e que permitem uma resposta mais fundamentada em situações detentoras de novidade.
Ora... em que é que ficamos?
Eu respondo rapidamente: prefiro a flexibilidade de Eugénio de Andrade à inflexibilidade (notável, é um facto) de Álvaro Cunhal:

É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,

ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas.

É urgente inventar alegria,

multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor,
é urgente permanecer.

08 junho 2005

O sol ou a chuva e a esperança de um novo dia

Hoje de manhã ouvi, pela primeira vez e com alguma atenção, o single do último álbum dos Blind Zero e uma pequena entrevista à banda.
Desde essa altura que fiquei a pensar no nome do álbum e no título e parte da letra do single.
O álbum chama-se "The night before and a new day". Quando foi questionado acerca da razão para a escolha deste nome, o vocalista da banda respondeu que este álbum era um álbum mais maduro. Menos psicótico e intimista que os anteriores e, por conseguinte, mais confiante, optimista e feliz.
Quanto ao excerto da letra do single (cujo título é Shine on) que me chamou a atenção é o seguinte:

You defy, I remain
Prisoner of your decisions
I dream, you laugh
I can remember how it started
One day, you'll see
Details will make all the difference
I love you, goodbye

Percebi imediatamente a força da associação: um álbum mais confiante, optimista e feliz deve ter como título do primeiro single a palavra Shine. É uma excelente headline.
E para provar que também gosto de palavras, foi então que percebi a razão por que fiquei a pensar no nome do álbum e no título e letra do single. Na actual conjuntura política e social Portuguesa, o nome do álbum devia ser o objectivo de todos e cada um dos Portugueses: fundar uma amanhã melhor, livre das nuvens psicóticas e sebastianistas do passado, um amanhã em que não houvesse vontade de dizer "I love you, goodbye".
Quanto ao shine on...Portugal não precisa de sol. Precisa de chuva. Ininterrupta. Semanas e semanas. Para lavar a cara e tirar o cheiro a bafio, a incêndios, a suor, a terra seca, a tricas e a podre. Tal como dizia o Miguel Sousa Tavares há uns tempos n'O Público, uma chuva regeneradora.

07 junho 2005

Acessorium sequitur principale

Faço parte de uma grande maioria que confessa, amargurada, andar a ler menos do que deseja.
E este facto é, nas circunstâncias actuais, pouco menos que uma tragédia.
Nestes tempos de indefinição política e social, de um relativismo moral atroz, é cada vez mais necessário ler. Ler para estar informado. Ler para poder informar. Ler para conseguir fundamentar as escolhas que diariamente temos de fazer.
Será que os nossos representantes, que escolhemos ciclicamente e a quem pagamos para tomarem decisões, também lêem?
Será que alguma vez leram o livro Siddhartha, de Hermann Hesse?

"(...) [N]ão aprecio as doutrinas, não têm dureza ou moleza, não têm cores, não têm arestas, não têm cheiro, não têm gosto, nada têm senão palavras. Talvez seja isso que te impede de encontrares a paz, talvez sejam as palavras em excesso. Porque também libertação e virtude (...) são meras palavras."

05 junho 2005

Portugal no dia 05 de Julho de 2005

As reformas.
As pensões.
A seca.
A Europa.
A política.
O Não.
Os jornalistas.
Os comentadores.
Os dirigentes.
O futebol.

*sigh*

Depois da Feira

Vão vagos pela estrada,

Cantando sem razão
A útima esp'rança dada
À última ilusão.
Não significam nada.
Mimos e bobos são.

Vão juntos e diversos
Sob um luar de ver,
Em que sonhos imersos
Nem saberão dizer,
E cantam aqueles versos
Que lembram sem querer.

Pajens de um morto mito,

Tão líricos!, tão sós!,
Não têm na voz um grito,
Mal têm a própria voz;
E ignora-os o infinito
Que nos ignora a nós.

Fernando Pessoa, Cancioneiro

02 junho 2005

Porque sim e porque não

Escrever...
Escrever porque sim, escrever porque não, escrever porque não quero falar, escrever porque nem sequer escrever me apetece.
É essa a aventura da escrita. Exprimir toda e qualquer emoção.
No fundo escrever é oficializar formalmente a esquizofrenia humana, convencionar o turbilhão emocional que nos varre.
Não interessa se há quem goste, quem leia... no limite nem interessa escrever ou o que escrevemos ou a pessoa e a emoção que somos quando escrevemos.
Ainda a este respeito, confesso que estou rendido. Incondicionalmente.
Trocava grande parte das palavras que já escrevi pela capacidade de escrever estas palavras, desta forma:

Mesmo que os meus versos nunca sejam impressos,
Eles lá terão a sua beleza, se forem belos.
Mas eles não podem ser belos e ficar por imprimir,
Porque as raízes podem estar debaixo da terra
Mas as flores florescem ao ar livre e à vista.
Tem que ser assim por força. Nada o pode impedir.

Alberto Caeiro (07-11-1915)

Este blog é, deste modo, a face visível das minhas raízes, a flor e a erva daninha que convivem dentro de mim.

31 maio 2005

O tempo, Portugal e os Portugueses

Será que o que quer que o tempo seja é diferente para nós por sermos Portugueses?
Será que o que conta mais é o que o tempo é ou pode ser ou o que nós somos e (não) podemos ser como Portugueses?
Há pouco tempo o Presidente da Comissão Europeia - um Português de seu nome José Manuel Durão Barroso - dizia a propósito de um outro Português, também ele José (um tal de Mourinho) que este último não era um Português típico porque não era modesto, envergonhado e tímido (podem consultar toda a notícia aqui).

Bom... isso já se sabia há uns tempos. Pelo menos desde que alguém aprisionou a alma Portuguesa em poucas palavras, desta forma:

Eras sobre eras se somem
No tempo que em eras vem.
Ser descontente é ser homem.
Que as forças cegas se domem
Pela visão que a alma tem!

E assim, passados os quatro
Tempos do ser que sonhou,
A terra será teatro
Do dia claro, que no atro
Da erma noite começou.

Grécia, Roma, Cristandade,
Europa - os quatro se vão
Para onde vai toda a idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu D. Sebastião?

E siga para o eterno retorno... será que o que quer que o tempo seja é diferente para nós por sermos Portugueses?
Ou o tempo é sempre diferente e nós somos sempre Portugueses?

30 maio 2005

Conversas sobre o tempo

Algumas coisas que o tempo pode ser: ventoso, pouco, uma falsa questão, cronometrado, designar as semanas de gravidez.

Ora, segundo o dicionário, a palavra tempo provém do latim tempus e é um substantivo masculino que pode ser utilizado para exprimir:

duração limitada, por oposição à ideia de eternidade;
período;
época;
sucessão de anos, dias, horas, momentos, que envolve, para o homem, a noção de presente, passado e futuro;
meio indefinido onde se desenrolam, irreversivelmente, as existências na sua mutação, os acontecimentos e os fenómenos na sua sucessão;
certo período determinado em que decorre um facto ou vive uma personagem;
oportunidade;
ensejo;
estação ou ocasião própria;
prazo;
duração;
estado atmosférico;


O tempo pode ainda ser o que fazemos dele (esta definição não é minha...) e muitas coisas mais.
Em boa verdade parece-me que o tempo constipa-se passado um tempo. E quando julgávamos que a sua definição concreta e universal assentava perfeitamente na nossa compreensão, o próprio tempo encarrega-se de a tornar obsoleta e ridícula.
Deste modo aqui fica a minha definição de tempo neste momento: período que não temos para nós para, por exemplo, ir ao judo, ir nadar, namorar e conversar com os amigos numa mesa cheia de cerveja e burriés.

Amanhã o tempo vai perguntar ao tempo quanto tempo o tempo tem. E o tempo vai-lhe dizer que o tempo tem por tempo o tempo que o tempo tem. E vai espirrar e morrer no minuto seguinte.

A razão do nome...

os sonhos do mundo.
Podia perder algum tempo com explicações metafísicas, esotéricas.
Podia até escrever um testamento interminável acerca da proximidade semântica entre a expressão do nome do blog e...
Mas não vale a pena.
Para que se vão habituando à economia de palavras neste espaço, aqui fica a razão: é uma homenagem, singela.

"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo."

Tabacaria, Álvaro de Campos